Companhia Arte em Espetáculos

quarta-feira, 22 de agosto de 2012

Crônica- NAQUELA MESA



A letra do chorinho intitulado Naquela Mesa, de autoria do compositor Sérgio Bittencourt em homenagem ao seu falecido pai, o  músico Jacob do Bandolin, é poética. Para os que não se lembram e para aqueles que não conhecem, a letra é a seguinte:

"Naquela mesa ele sentava sempre
E me dizia sempre o que é viver melhor      
Naquela mesa ele contava estórias
Que hoje na memória eu guardo e sei decor
Naquela mesa ele juntava a gente
E contava contente o que fez de manhã
E nos seus olhos era tanto brilho
Que mais que seu filho, eu fiquei seu fã 
Eu não sabia que doía tanto uma mesa num canto  
Uma casa e um jardim 
Se eu soubesse o quanto dói a vida
Essa dor tão doida não doía assim
Agora  resta uma mesa na sala
E hoje ninguém mais fala no seu bandolim
Naquela mesa tá faltando ele
E a saudade dele tá doendo em mim."
 
Letra e Música de Sérgio Bitencourt
















Jacó do Bandolim


No dia 13 de agosto de 1969, Jacob do Bandolim, morreu de infarto e edema pulmonar, aos quarenta e um anos de idade. Ele fumava seis maços de cigarro por dia. Tentou de tudo, mas não conseguiu largar o vício e este o levou tão prematuramente. Quanta saudade deixou, a ponto de seu filho compor o magnífico chorinho.
Pois é, lembrei-me da letra dessa música ao me encontrar com amigos em volta da mesa de um  bar.
Certa vez alguém me disse que boteco é um lugar muito chato, onde é preciso gritar para ser ouvido,  se esforçar para ouvir e para conseguir ficar durante horas, sentado numa cadeira dura enquanto é defumado pela fumaça dos cigarros, só tomando muita cerveja.
Assim sendo, mesmo concordando com esta frase, aceitei o convite de meu marido, que fez questão que eu o acompanhasse numa confraternização, mesmo sabendo que eu seria a única mulher no grupo.
Como somos amigos em comum, de longa data, os assuntos começaram a rolar, e impreterivelmente o que predominou foram as piadas. Eu estava em desvantagem, portanto, as piadas sobre mulheres surgiram, é claro.
Eu fiquei sossegada e na minha, enquanto degustava o meu lanche, um delicioso sanduíche a quatro queijos, enquanto os sábios rapazes, todos “cinquentões”, mandavam ver no engordurado lanche com salame, lombo, bacon e etc.
Entre os quatro mancebos, estavam um médico,  um chefe de CPD, um micro empresário e  um gerente de companhia aérea. Este último o mais badalado de todos, que domina com maestria a arte de contar piadas, fumava um cigarro após outro e bebia cerveja compulsivamente, enquanto desfilava seu imenso repertório de anedotas.
Como participar tão passivamente de uma conversa em que um deles, que é médico, dizia que estava preparando a esposa para tornar-se uma viúva? Eu estranhei e perguntei porque a razão daquilo. Ele então respondeu com a  maior naturalidade:
-      Ora, vocês mulheres se cuidam mais. Agora nós...... 
Ele então se dirigiu para o colega contador de piadas dizendo:
-      Por exemplo, o nosso amigo aqui, que fuma feito uma chaminé. Ele sabe as consequencias do seu vício, e está feliz assim.
Eu tentei falar que é preciso se cuidar, pois tinha assistido a um programa na TV, que mostrou sobre a qualidade  de vida dos idosos, mas o médico me interrompeu dizendo: 
- Eu acho ridículo, esses velhos que vão à academia, fazem ginástica e caminhada.
Eu fiquei decepcionada, pois sou de uma família em que as pessoas vivem muito. Minha avó materna morreu com 102 anos e adorava a vida.
E ele, continuou:
-      Do jeito que estou indo, não vou durar muito e nem quero. O que me importa é o presente. Eu tento vivê-lo à minha maneira, sem apego a padrões e conceitos. 
E novamente dirigindo-se ao amigo fumante pergunta: 
-      E você, como acha que estará aos oitenta anos?
Ele deu uma longa tragada e com o olhar perdido em meio à fumaça, falou:
-      Morto.
Todos riram muito.
Daí, eu me lembrei da referida música e dos motivos que ceifaram a vida do Jacob do Bandolim, pai do Sérgio Bittencourt.  Eu estava naquela mesa, só que de bar, com pessoas que conheço desde a minha adolescência. Senti uma tristeza infinita, ao ver um profundo vazio no olhar de meu amigo, exímio contador de piadas, que na completa entrega ao vício, esquece-se que poderá deixar saudade, podendo causar muito sofrimento naqueles que tanto o amam. Ele, um sábio em fazer rir,  não sabe que naquele momento senti vontade de chorar.   

ROSANA MONTERO CAPPI

6 comentários:

Poesias Inadequadas disse...

Rosana! Em uma fria madrugada do ano de 1973 eu estava de plantão no 5º Grupamento de Canhões 90mm Anti-aéreo, e ouvi pela primeira vez esta música. A partir deste dia comecei a prestar mais atenção nas letras e músicas. Quem sabe nesta fria madrugado meu lado poético foi despertado. Obrigado por mais este momento. Abraços fraternais do sempre Amigo, José Luiz Pires.

Rachel disse...

AGRADEÇO SEMPRE TER CONSEGUIDO DEIXAR O FUMO HÁ QUASE 30 ANOS! E CONSEGUI ENSINAR MEU MÉTODO A ALGUMAS OUTRAS PESSOAS, INCLUSIVE MINHA MÃE, QUE FUMAVA HÁ 60 ANOS E DEIXOU O VÍCIO COM 80 ANOS; MORREU COM 85. JÁ NÃO HAVIA MAIS TEMPO, MAS LARGOU! SUA CRÔNICA É ÓTIMA POR FAZER MENÇÃO A ESSE VÍCIO, ALÉM DE COLOCAR COM MUITA PROPRIEDADE UMA SIMPLES RODA DE AMIGOS E EMOCIONAR COM ELA! COMO SEMPRE, PARABÉNS. VOCÊ ARRASOU! RSRSRS

Torres De Campinas disse...

OI ROSANA AQUI ESTOU PARA DAR MEU DEPOIMENTO, APÓS A LEITURA, DE NAQUELA MESA. CERTA VEZ QUANDO FUI BUSCAR MINHA FILHA NA PUCC CENTRAL, E AO PASSAR NA ESQUINA DE FRANCISCO GLICÉRIO COM BARRETO LEME, OLHEI A DIREITA E VI UM BAR QUE LA EXISTIA JUNTO AO ESTACIONAMENTO. DE IMEDIATO INICIE UMA MÚSICA NA QUAL SE FALA DE FUMAR , CERVEJA,ONVERSA,AMIZADE,
SEGUE TUDO A RESPEITO ( POR ACASO UM BAR DIFERENTE -NAS ESQUINA DAQUELA AVENIDA -ONDE AMIGOS SENTADOS A TARDE A BEBER E A CONVERSAR -FALAVAM SOBRE O PASSADO - ESQUEÇENDO O PRESENTE - FAZENDO MIL PLANOS PARA QUANDO O FUTURO CHEGAR -MUITA FUMAÇA NO AR- GENTE A CONVERSAR - NO HORIZONTE O SOL DESPONTA - NOVO DIA VAI COMEÇAR - POR ACASO.............- COMO CITEI MUITAS COISAS(DAQUELA)NAQUELA MESA , FAZEM PARTE DAQUELE BAR DIFERENTE.(TAMBEM SERVI EM 1958 NO 5° GCAM )

Marisilda Tescaroli disse...

Muito envolvente seu texto. Realmente quem faz o outro ri, muitas vezes tem uma espécie de desejo de morte, uma tristeza, como se fazer o outro rir fará desaparecer a dor que lhe vai na alma. Sem mais filosofias, reparto o que aprendi outro dia e achei interessante. Você falou que um deles disse que curte o dia, ou seja "carpe diem". Aprendi que essa expressão surgiu quando o Império Romano estava desniribabdi e era realmente em salve-se quem puder, pois a qualquer momento haveria uma invasão bárbara e não se sabia quem iria sobreviver, e em que condições. Penso agora: viver o presente, mas não podemos esquecer que o passado nos faz o que somos, e o futuro é o resultado da somatória dos dois.

Rosilene disse...

Nossa que texto !
É de arrepiar !!
Como as pessoas não amam sua vidas, e não se preocupam coma as pessoas que os amam.
É sempre bom dar esse tipo de toque as pessoa que se encontram nessa situação.
Vamos torcer que reflitam e mudem seus vícios.
Parabéns querida irmã!
Um super beijo!

Rachel disse...

Conteúdo: verdadeiro, objetivo, claro. Forma: como sempre, você se esmera! Sou sua fã de carteirinha! Parabéns, querida. Rachel